[ Humanizar a Terra ]

  Humanizar a Terra - O Olhar Interior

Notas

  1. A meditação
  2. Disposição para compreender
  3. O sem-sentido
  4. A dependência
  5. A suspeita do sentido
  6. Sonho e despertar
  7. Presença da Força
  8. Controlo da Força
  9. Manifestações da energia
  10. Evidência do sentido
  11. O centro luminoso
  12. Os descobrimentos
  13. Os princípios
  14. O guia do caminho interno
  15. A experiência de paz e a passagem da Força
  16. Projecção da Força
  17. Perda e repressão da Força
  18. Acção e reacção da Força
  19. Os estados internos
  20. A realidade interior

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A meditação

1. Aqui se conta como se converte o sem-sentido da vida em sentido e plenitude.

2. Aqui há alegria, amor ao corpo, à natureza, à humanidade e ao espírito.

3. Aqui renega-se os sacrifícios, o sentimento de culpa e as ameaças do além!

4. Aqui não se opõe o terreno ao eterno.

5. Aqui fala-se da revelação interior, à qual chega todo aquele que cuidadosamente medita em humilde busca.

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Disposição para compreender

1. Sei como te sentes porque posso experimentar o teu estado, mas tu não sabes como se experimenta o que digo. Por conseguinte, se te falo com desinteresse daquilo que faz feliz e livre o ser humano, vale a pena que tentes compreender.

2. Não penses que vais compreender discutindo comigo. Se crês que contrariando isto o teu entendimento se aclara, podes fazê-lo, mas não é esse o caminho que corresponde neste caso.

3. Se me perguntas qual é a atitude que convém, dir-te-ei que é a de meditar em profundidade e sem pressa no que te explico aqui.

4. Se replicas que tens coisas mais urgentes com que te ocupares, responderei que, sendo o teu desejo dormir ou morrer, não farei nada para me opôr.

5. Não argumentes tão-pouco que te desagrada o meu modo de apresentar as coisas, porque isso não dizes da casca quando te agrada o fruto.

6. Exponho do modo que me parece conveniente, não daquele que seria desejável para quem aspira a coisas afastadas da verdade interior.

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O sem-sentido

Em muitos dias descobri este grande paradoxo: aqueles que levaram o fracasso no seu coração puderam iluminar o último triunfo; aqueles que se sentiram triunfadores, ficaram no caminho como vegetais de vida difusa e apagada. Em muitos dias cheguei eu à luz, vindo das mais obscuras escuridões, guiado não por ensinamentos, mas por meditação.

Eis o que disse a mim mesmo no primeiro dia:

1. Não há sentido na vida se tudo termina com a morte.

2. Toda a justificação das acções, sejam estas desprezíveis ou excelentes, é sempre um novo sonho que deixa o vazio pela frente.

3. Deus não é algo certo.

4. A fé é tão variável como a razão e o sonho.

5. "O que se deve fazer" pode-se discutir na totalidade, e não há argumento definitivo em apoio das explicações.

6. "A responsabilidade" de quem se compromete com algo, não é maior do que a responsabilidade daquele que não se compromete.

7. Movo-me segundo os meus interesses e isto não me converte em cobarde, nem tão-pouco em herói.

8. "Os meus interesses" não justificam nem desacreditam nada.

9. "As minhas razões" não são melhores nem piores do que as razões de outros.

10. A crueldade horroriza-me, mas não por isso é em si mesma pior ou melhor que a bondade.

11. O dito hoje, por mim ou por outros, não vale amanhã.

12. Morrer não é melhor que viver ou não ter nascido, mas também não é pior.

13. Descobri, não por ensinamento, mas sim por experiência e meditação, que não há sentido na vida se tudo termina com a morte.

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A dependência

O dia segundo:

1. Tudo o que faço, sinto e penso não depende de mim.

2. Sou variável e dependo da acção do meio. Quando quero mudar o meio ou o meu "eu", é o meio que me muda. Então procuro a cidade ou a natureza, a redenção social ou uma nova luta que justifique a minha existência... Em cada um desses casos, o meio leva-me a decidir por uma ou por outra atitude. Dessa maneira, os meus interesses e o meio aqui me deixam.

3. Digo, então, que não importa o quê ou quem decide. Digo nessas ocasiões que tenho que viver, já que estou em situação de viver. Digo tudo isto, mas não há nada que o justifique. Posso decidir-me, vacilar ou permanecer. De qualquer maneira, uma coisa é melhor que outra provisoriamente, mas não há "melhor" nem "pior" em definitivo.

4. Se alguém me diz que aquele que não come morre, responder-lhe-ei que assim é, com efeito, e que é obrigado a comer aguilhoado pelas suas necessidades, mas não acrescentarei a isso que a sua luta por comer justifica a sua existência. Também não direi que isso seja mau. Direi, com simplicidade que se trata de um facto individual ou colectivamente necessário para a subsistência, mas sem sentido no momento em que se perde a última batalha.

5. Direi, além disso, que me solidarizo com a luta do pobre e do explorado e do perseguido. Direi que me sinto "realizado" com tal identificação, mas compreenderei que nada justifico.

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A suspeita do sentido

O dia terceiro:

1. Às vezes adiantei-me a factos que depois aconteceram.

2. Às vezes captei um pensamento longínquo.

3. Às vezes descrevi lugares que nunca visitei.

4. Às vezes relatei com exactidão o que aconteceu na minha ausência.

5. Às vezes uma alegria imensa surpreendeu-me.

6. Às vezes uma compreensão total invadiu-me.

7. Às vezes uma comunhão perfeita com tudo extasiou-me.

8. Às vezes rompi os meus devaneios e vi a realidade de um modo novo.

9. Às vezes reconheci como se visse novamente, algo que via pela primeira vez.

... E tudo isso deu-me que pensar.

Dou-me conta que, sem essas experiências, não podia ter saído do sem-sentido.

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Sonho e despertar

O dia quarto:

1. Não posso tomar como real o que vejo nos meus sonhos; nem o que vejo em semi-sono; nem o que vejo desperto, mas devaneando.

2. Posso tomar como real o que vejo desperto e sem devaneio. Isto não se refere ao que registam os meus sentidos, mas sim às actividades da minha mente quando se referem aos "dados" pensados. Porque os dados ingénuos e duvidosos são entregues pelos sentidos externos e também pelos internos, e também pela memória. O que é válido é que a minha mente sabe disso quando está desperta e crê nisso quando está adormecida. Raras vezes percebo o real de um modo novo e então compreendo que o que se vê normalmente, parece-se com o sonho ou parece-se com o semi-sono.

Há uma forma real de estar desperto: é a que me tem levado a meditar profundamente sobre o que foi dito até aqui. E é, além disso, a que me abriu a porta para descobrir o sentido de tudo o que existe.

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Presença da Força

O dia quinto:

1. Quando estava realmente desperto, ia escalando de compreensão em compreensão.

2. Quando estava realmente desperto e me faltava vigor para continuar a ascensão, podia extrair a Força de mim mesmo. Ela estava em todo o meu corpo. Toda a energia estava até nas mais pequenas células do meu corpo. Esta energia circulava e era mais veloz e intensa que o sangue.

3. Descobri que a energia se concentrava nos pontos do meu corpo quando estes actuavam e se ausentava quando neles não havia acção.

4. Durante as doenças, a energia faltava ou acumulava-se exactamente nos pontos afectados. Mas, se conseguia restabelecer a sua passagem normal, muitas doenças começavam a retroceder.

Alguns povos conheceram isto e actuaram restabelecendo a energia mediante diversos procedimentos, que hoje nos são estranhos.

Alguns povos conheceram isto e os seus eleitos actuaram, comunicando essa energia a outros, e produziram-se "iluminações" de compreensão e até "milagres" físicos.

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Controlo da Força

O dia sexto:

1. Há uma forma de dirigir e concentrar a Força que circula pelo corpo.

2. Há pontos de controlo no corpo. Deles depende o que conhecemos como movimento, emoção e ideia. Quando a energia actua nesses pontos, produzem-se as manifestações motrizes, emotivas e intelectuais.

3. Segundo a energia actue mais interna ou superficialmente no corpo, surge o sono profundo, o semi-sono ou o estado de desperto... Certamente, as auréolas que rodeiam o corpo ou a cabeça dos santos (ou dos grandes despertos), nas pinturas das religiões, aludem a esse fenómeno da energia que, em ocasiões, se manifesta mais externamente.

4. Há um ponto de controlo do estar-desperto-verdadeiro e há uma forma de levar a Força até ele.

5. Quando se leva a energia a esse lugar, todos os outros pontos de controlo movem-se de modo alterado.

Ao entender isto e ao lançar a Força a esse ponto superior, todo o meu corpo sentiu o impacto de uma energia enorme e ela golpeou fortemente a minha consciência, e ascendi de compreensão em compreensão. Mas também observei que podia descer em direcção às profundidades da mente se perdesse o controlo da energia. Recordei então as lendas sobre os "céus" e os "infernos" e vi a linha divisória entre ambos estados mentais.

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Manifestações da energia

O dia sétimo:

1. Esta energia em movimento podia "tornar-se independente" do corpo, mantendo a sua unidade.

2. Esta energia unida era uma espécie de "duplo corpo" que correspondia à representação cenestésica do próprio corpo, no interior do espaço de representação (da existência deste espaço, assim como das representações que correspondiam às sensações internas do corpo, as ciências que tratavam dos fenómenos mentais não davam notícia suficiente).

3. A energia des-dobrada (quer dizer: imaginada como "fora" do corpo, ou "separada" da base material) dissolvia-se como imagem ou representava-se correctamente, dependendo da unidade interna que tivesse quem operava assim.

4. Pude comprovar que a "exteriorização" dessa energia (representação do próprio corpo como "fora" do corpo) produzia-se já desde os níveis mais baixos da mente. Nesses casos, sucedia que o atentado contra a unidade mais primária da vida, provocava essa resposta para salvaguardar o ameaçado. Por isso, no transe de alguns médiums, cujo nível de consciência era baixo e cuja unidade interna estava em perigo, estas respostas eram involuntárias e não eram reconhecidas como sendo produzidas por eles mesmos, mas sim atribuídas a outras entidades.

Os "fantasmas" ou "espíritos" de alguns povos ou de alguns adivinhos não eram senão os próprios "duplos" (as próprias representações) daquelas pessoas que se sentiam tomadas por eles. Como o seu estado mental estava escurecido (em transe), por terem perdido o controlo da Força, sentiam-se manejadas por seres estranhos que às vezes produziam fenómenos notáveis. Sem dúvida que muitos "endemoninhados" sofreram tais efeitos. O decisivo era, então, o controlo da Força.

Isto fazia variar por completo tanto a minha concepção da vida corrente, como da vida posterior à morte. Mediante estes pensamentos e experiências, fui perdendo fé na morte e desde então não creio nela, como não creio no sem-sentido da vida.

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Evidência do sentido

O dia oitavo:

1. A real importância da vida desperta tornou-se-me patente.

2. A real importância de destruir as contradições internas convenceu-me.

3. A real importância de manejar a Força, a fim de conseguir unidade e continuidade, encheu-me de um alegre sentido.

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O centro luminoso

O dia nono:

1. Na Força estava a "luz" que provinha de um "centro".

2. Na dissolução da energia havia um afastamento do centro e, na sua unificação e evolução, um correspondente funcionamento do centro luminoso.

Não me estranhou encontrar em antigos povos a devoção pelo deus-Sol e vi que, se alguns adoraram o astro porque dava vida à sua terra e à natureza, outros perceberam nesse corpo majestoso o símbolo de uma realidade maior.

Houve quem fosse mais longe ainda e recebesse desse centro incontáveis dons, que às vezes "desceram" como línguas de fogo sobre os inspirados, às vezes como esferas luminosas, às vezes como sarças ardentes que se apresentaram diante do temeroso crente.

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Os descobrimentos

O dia décimo:

Poucos, mas importantes, foram os meus descobrimentos, que resumo deste modo:

1. A Força circula pelo corpo involuntariamente, mas pode ser orientada por um esforço consciente. A consecução de uma mudança dirigida do nível de consciência oferece ao ser humano um importante vislumbre de libertação das condições "naturais", que parecem impôr-se à consciência.

2. No corpo existem pontos de controlo das suas diversas actividades.

3. Há diferenças entre o estado de desperto-verdadeiro e outros níveis de consciência.

4. Pode conduzir-se a Força ao ponto do real despertar (entendendo por "Força" a energia mental que acompanha determinadas imagens e por "ponto" a colocação de uma imagem num "lugar" do espaço de representação).

Estas conclusões fizeram-me reconhecer nas orações dos povos antigos, o gérmen de uma grande verdade que se obscureceu nos ritos e práticas externas, não tendo eles chegado a desenvolver o trabalho interno que, realizado com perfeição, põe o Homem em contacto com a sua fonte luminosa.

Finalmente, dei-me conta de que os meus "descobrimentos" não eram tais, mas sim que se deviam à revelação interior a que acede todo aquele que, sem contradições, procura a luz no seu próprio coração.

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Os princípios

Diferente é a atitude perante a vida e as coisas quando a revelação interna fere como um raio.

Seguindo os passos lentamente, meditando no dito e no ainda por dizer, podes converter o sem-sentido em sentido.

Não é indiferente o que faças com a tua vida. A tua vida, submetida a leis, está exposta perante possibilidades a escolher.

Eu não te falo de liberdade. Falo-te de libertação, de movimento, de processo. Não te falo de liberdade como algo quieto, mas sim de libertar-se passo a passo, como se vai libertando do necessário caminho percorrido aquele que se aproxima da sua cidade. Então, "o que se deve fazer" não depende de uma moral longínqua, incompreensivel e convencional, mas sim de leis: leis de vida, de luz, de evolução.

Eis os chamados "Princípios" que podem ajudar na busca da unidade interior.

1. Ir contra a evolução das coisas é ir contra si mesmo.

2. Quando forças algo para um fim, produzes o contrário.

3. Não te oponhas a uma grande força. Retrocede até que ela se debilite; então, avança com resolução.

4. As coisas estão bem quando avançam em conjunto, não isoladamente.

5. Se para ti estão bem o dia e a noite, o Verão e o Inverno, superaste as contradições.

6. Se persegues o prazer, acorrentas-te ao sofrimento. Mas, contanto que não prejudiques a tua saúde, goza sem inibição quando a oportunidade se apresente.

7. Se persegues um fim, acorrentas-te. Se tudo o que fazes é realizado como se fosse um fim em si mesmo, libertas-te.

8. Farás desaparecer os teus conflitos quando os entendas na sua última raiz e não quando os queiras resolver.

9. Quando prejudicas os demais, ficas acorrentado. Mas, se não prejudicas outros, podes fazer tudo o que queiras com liberdade.

10. Quando tratas os outros como queres que te tratem, libertas-te.

11. Não importa em que facção ou grupo te puseram os acontecimentos. O que importa é que compreendas que tu não escolheste nenhum grupo.

12. Os actos contraditórios ou unitivos acumulam-se em ti. Se repetes os teus actos de unidade interna, já nada poderá deter-te.

Serás como uma força da natureza quando à sua passagem não encontra resistência. Aprende a distinguir aquilo que é dificuldade, problema, inconveniente, disto que é contradição. Se aqueles te movem ou te incitam, esta imobiliza-te num círculo fechado.

Quando encontres uma grande força, alegria e bondade no teu coração; ou quando te sintas livre e sem contradições, imediatamente agradece no teu interior. Quando te aconteça o contrário, pede com fé e aquele agradecimento que acumulaste voltará convertido e ampliado em benefício.

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O guia do caminho interno

Se compreendeste o que foi explicado até aqui, podes então experimentar, mediante um simples trabalho, a manifestação da Força. Ora bem, não é igual observares uma posição mental mais ou menos correcta (como se se tratasse de uma disposição para uma actividade técnica) do que assumires um tom e uma abertura emotiva próxima àquela que inspiram os poemas. É por isso que a linguagem usada para transmitir estas verdades tende a facilitar essa postura, que põe mais fácilmente em presença da percepção interna e não de uma ideia ácerca da "percepção interna".

Agora segue com atenção o que te vou explicar, já que trata da paisagem interior que podes encontrar ao trabalhar com a Força e das direcções que podes imprimir aos teus movimentos mentais.

"Pelo caminho interno podes andar escurecido ou luminoso. Atenta às duas vias que se abrem diante de ti.

Se deixas que o teu ser se lance em direcção a regiões obscuras, o teu corpo ganha a batalha e ele domina. Então, brotarão sensações e aparências de espíritos, de forças, de recordações. Por aí desce-se mais e mais. Ali estão o Ódio, a Vingança, a Estranheza, a Possessão, os Ciúmes, o Desejo de Permanecer. Se desces mais ainda, invadir-te-ão a Frustração, o Ressentimento e todos aqueles devaneios e desejos que têm provocado ruína e morte à humanidade.

Se impeles o teu ser em direcção luminosa, encontrarás resistência e fadiga a cada passo. Esta fadiga da ascensão tem culpados. A tua vida pesa, as tuas recordações pesam, as tuas acções anteriores impedem a ascensão. Esta escalada é difícil por acção do teu corpo que tende a dominar.

Nos passos da ascensão encontram-se regiões estranhas, de cores puras e de sons não conhecidos.

Não fujas da purificação que actua como o fogo e que horroriza com os seus fantasmas.

Repele o sobressalto e o desalento.

Repele o desejo de fugir para regiões baixas e obscuras.

Repele o apego às recordações.

Fica em liberdade interior, indiferente ao devaneio da paisagem, com resolução na ascensão.

A luz pura clareia nos cumes das altas cadeias montanhosas e as águas das mil-cores descem, por entre melodias irreconhecíveis, para mesetas e pradarias cristalinas.

Não temas a pressão da luz que te afasta do seu centro cada vez com mais força. Absorve-a como se fosse um líquido ou um vento, porque nela, certamente, está a vida.

Quando, na grande cadeia montanhosa, encontres a cidade escondida, deves conhecer a entrada. Mas, isto sabê-lo-ás no momento em que a tua vida seja transformada. As suas enormes muralhas estão escritas em figuras, estão escritas em cores, estão "sentidas". Nesta cidade guarda-se o feito e o que está por fazer... Mas, para o teu olho interno é opaco o transparente. Sim, os muros são-te impenetráveis!

Toma a Força da cidade escondida. Volta ao mundo da vida densa, com a tua fronte e as tuas mãos luminosas".

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A experiência de paz e a passagem da Força

1. Relaxa plenamente o teu corpo e aquieta a mente. Então, imagina uma esfera transparente e luminosa que, descendo para ti, termina por alojar-se no teu coração. Reconhecerás imediatamente que a esfera deixa de aparecer como imagem para se transformar em sensação dentro do peito.

2. Observa como a sensação da esfera se expande lentamente, do teu coração para fora do corpo, ao mesmo tempo que a tua respiração se torna mais ampla e profunda. Ao chegar a sensação aos limites do corpo, podes deter aí toda a operação e registar a experiência de paz interior. Nela podes permanecer o tempo que te pareça adequado. Então, faz retroceder essa expansão anterior (chegando, como de começo, ao coração), para te desprenderes da tua esfera e concluir o exercício calmo e reconfortado. A este trabalho chama-se-lhe "experiência de paz".

3. Porém, ao invés, se quisesses experimentar a passagem da Força, em vez de retroceder na expansão deverias aumentá-la, deixando que as tuas emoções e todo o teu ser a sigam. Não trates de pôr a tua atenção na respiração... Deixa que ela actue por si só, enquanto segues a expansão fora do teu corpo.

4. Devo repetir-te isto: a tua atenção, em tais momentos, deve estar posta na sensação da esfera que se expande. Se não o consegues, convém que te detenhas e o tentes noutra oportunidade. De qualquer maneira, se não produzes a passagem, poderás experimentar uma interessante sensação de paz.

5. Se, ao invés, foste mais longe, começarás a experimentar a passagem. Das tuas mãos e outras zonas do corpo, chegar-te-á um tom de sensação diferente do habitual. Depois, sentirás ondulações progressivas e, em pouco tempo, brotarão com vigor imagens e emoções. Deixa então que se produza a passagem...

6. Ao receber a Força, percepcionarás a luz ou estranhos sons dependentes do teu particular modo de representação habitual. Em qualquer caso, importante será a experimentação da ampliação da consciência, um de cujos indicadores deverá ser uma maior lucidez e disposição para compreender o que ocorre.

7. Quando desejares, podes terminar com esse singular estado (se é que antes não se foi diluindo pelo simples decorrer), imaginando ou sentindo que a esfera se contrai e depois sai de ti, do mesmo modo que chegou ao começar tudo aquilo.

8. Interessa compreender que numerosos estados alterados de consciência têm sido e são conseguidos, quase sempre, pondo em marcha mecanismos similares aos descritos. Naturalmente, revestidos de estranhos rituais ou às vezes reforçados com práticas de esgotamento, desenfreamento motriz, repetição e posturas que, em todos os casos, alteram a respiração e distorcem a sensação geral do intracorpo. Deves reconhecer nesse campo a hipnose, a mediunidade e também a acção de droga que, actuando por outra via, produzem semelhantes alterações. E, claro, todos os casos mencionados têm como signo o não controlo e o desconhecimento do que se passa. Desconfia dessas manifestações e considera-as simples "transes", pelos quais passaram os ignorantes, os experimentadores e ainda os "santos", segundo contam as lendas.

9. Se trabalhaste observando o recomendado, pode acontecer, não obstante, que não tenhas conseguido a passagem. Isso não se pode converter em foco de preocupação, mas sim em indicador de falta de "soltura" interior, o que poderia reflectir muita tensão, problemas na dinâmica de imagem e, em suma, fragmentação no comportamento emotivo... Coisa que, por outro lado, estará presente na vida quotidiana.

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Projecção da Força

1. Se experimentaste a passagem da Força, poderás compreender como, baseando-se em fenómenos similares, mas sem nenhuma compreensão, distintos povos puseram em marcha ritos e cultos que depois se multiplicaram sem cessar. Assim, quando, por experiências antes comentadas, as pessoas sentiram o seu corpo "desdobrado" e a experiência da Força lhes deu a sensação de que (ao ampliar-se a representação) esta energia estava "fora", acreditaram que podiam projectá-la para fora de si.

2. A Força foi "projectada" para outros e também para objectos particularmente "aptos" para recebê-la e conservá-la. Confio em que não te será difícil entender a função que tiveram certos sacramentos em distintas religiões e, igualmente, o significado de lugares sagrados e de sacerdotes supostamente "carregados" com a Força (com especiais "dons"). Quando alguns objectos foram adorados com fé nos templos e rodeados de cerimónia e rito, certamente "devolveram" aos crentes a energia acumulada por meio de oração repetida. E é uma limitação ao conhecimento do facto humano que, quase sempre, se tenha visto estas coisas pela explicação externa, segundo cultura, espaço, história e tradição; quando a experiência interna básica é um dado essencial para entender tudo isto.

3. Este "projectar", "carregar" e "restituir" a Força, voltará a ocupar-nos mais adiante. Mas desde já te digo que o mesmo mecanismo continua a operar ainda em sociedades dessacralizadas, onde os líderes e os homens de prestígio estão nimbados de uma especial representação para aquele que os vê, que gostaria mesmo de "tocar-lhes" ou apoderar-se de um fragmento das suas roupas ou dos seus utensílios.

4. Porque qualquer representação do "alto" vai do olho para cima da linha normal do olhar. E "altas" são as personalidades que "possuem" a bondade, a sabedoria, e a força. E no "alto" estão as hierarquias e os poderes e as bandeiras e o Estado. E nós, comuns mortais, devemos "ascender" na escala social e aproximarmo-nos do poder a todo o custo. Que mal estamos, manejados ainda por esses mecanismos (que coincidem com a representação interna, com a nossa cabeça no "alto" e os nossos pés colados à terra). Que mal estamos, quando se crê nessas coisas (e crê-se porque têm a sua "realidade" na representação interna). Que mal estamos, quando o nosso olhar externo não é senão projecção ignorada do interno!

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Perda e repressão da Força

1. As maiores descargas de energia produzem-se por actos descontrolados. Estes são: a imaginação sem travão, a curiosidade sem controlo, a conversação desmedida, a sexualidade excessiva e a percepção exagerada (olhar, ouvir, degustar, etc., de maneira desbordada e sem objectivo). Mas deves reconhecer também que muitos procedem desse modo, porque descarregam as suas tensões, que de outro modo lhes seriam dolorosas. Considerando isto e vendo a função que cumprem tais descargas, convirás comigo que não é razoável reprimi-las, mas sim que é melhor ordená-las.

2. Quanto à sexualidade, deves interpretar correctamente isto: tal função não deve ser reprimida, porque nesse caso cria efeitos mortificantes e contradição interna. A sexualidade orienta-se e conclui no seu acto, mas não é conveniente que continue a afectar a imaginação ou a procurar novo objecto de possessão de modo obsessivo.

3. O controlo do sexo por uma determinada "moral" social ou religiosa, serviu desígnios que nada tinham a ver com a evolução, antes pelo contrário.

4. A Força (a energia da representação da sensação do intracorpo) desdobrou-se rumo ao crepuscular nas sociedades reprimidas e ali multiplicaram-se os casos de "endemoninhados", "bruxos", sacrílegos e criminosos de toda a espécie, que gozaram com o sofrimento e a destruição da vida e da beleza. Em algumas tribos e civilizações, os criminosos estiveram repartidos pelos que ditaram a justiça e os justiçados. Noutros casos, perseguiu-se tudo o que era ciência e progresso, porque se opunha ao irracional, ao crepuscular e ao reprimido.

5. em certos povos primitivos, existe ainda a repressão do sexo, assim como noutros considerados de "civilização avançada". É evidente que, nuns e noutros, o signo destrutivo é grande, ainda que nos dois casos a origem de tal situação seja diferente.

6. Se me pedes mais explicações, dir-te-ei que o sexo é na realidade santo e é o centro a partir do qual se impulsiona a vida e toda a criatividade; assim como desde ali se impulsiona toda a destruição, quando o seu funcionamento não está resolvido.

7. Jamais creias nas mentiras dos envenenadores da vida, quando se referem ao sexo como algo desprezível. Pelo contrário, nele há beleza e não em vão está relacionado com os melhores sentimentos de amor.

8. Sê cuidadoso então e considera-o como uma grande maravilha que se deve tratar com delicadeza, sem convertê-lo em fonte de contradição ou em desintegrador da energia vital.

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Acção e reacção da Força

Expliquei-te anteriormente: "Quando encontres uma grande força, alegria e bondade no teu coração ou quando te sintas livre e sem contradições, imediatamente agradece no teu interior."

1. "Agradecer" significa concentrar os estados de ânimo positivos, associados a uma imagem, a uma representação. Esse estado positivo, assim ligado, permite que em situações desfavoráveis, por evocar uma coisa, surja aquela que a acompanhou em momentos anteriores. Como, além disso, esta "carga" mental pode estar elevada por repetições anteriores, ela é capaz de desalojar emoções negativas que determinadas circunstâncias puderam impôr.

2. Por tudo isso, do teu interior voltará ampliado em benefício aquilo que pedires, sempre que tiveres acumulado em ti numerosos estados positivos. E já não necessito de repetir que este mecanismo serviu (confusamente) para "carregar fora" objectos ou pessoas, ou então entidades internas que se externalizaram, crendo-se que atenderiam rogos e pedidos.

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Os estados internos

Deves adquirir, agora, suficiente percepção dos estados internos em que te podes encontrar ao longo da tua vida e, particularmente, ao longo do teu trabalho evolutivo. Não tenho outra maneira de fazer a descrição que não seja com imagens (neste caso, alegorias). Estas, segundo me parece, têm por virtude concentrar "visualmente" estados de ânimo complexos. Por outro lado, a singularidade de encadear tais estados, como se fossem distintos momentos de um mesmo processo, introduz uma variante nas descrições sempre fragmentadas a que nos habituaram aqueles que se ocupam destas coisas.

1. O primeiro estado, no qual prevalece o sem-sentido (aquele que mencionamos ao princípio), será chamado "vitalidade difusa". Tudo se orienta pelas necessidades físicas, mas estas são confundidas amiúde com desejos e imagens contraditórias. Ali há escuridão nos motivos e nas actividades. Permanece-se nesse estado vegetando, perdido entre formas variáveis. Desse ponto, pode-se evoluir só por duas vias: a via da morte ou a da mutação.

2. A via da morte põe-te em presença de uma paisagem caótica e escura. Os antigos conheceram esta passagem e quase sempre a situaram "abaixo da terra" ou nas profundezas abismais. Também alguns visitaram esse reino, para depois "ressuscitar" em níveis luminosos. Capta bem isto de que "abaixo" da morte existe a vitalidade difusa. Talvez a mente humana relacione a desintegração moral com posteriores fenómenos de transformação e, também, talvez associe o movimento difuso com o prévio ao nascimento. Se a tua direcção é de ascensão, a "morte" significa uma ruptura com a tua etapa anterior. Pela via da morte ascende-se rumo a outro estado.

3. Chegando a ele, encontra-se o refúgio da regressão. Dali abrem-se dois caminhos: o do arrependimento e aquele outro que serviu para a ascensão, quer dizer: o caminho da morte. Se tomas o primeiro, é porque a tua decisão tende a romper com a tua vida passada. Se regressas pelo caminho da morte, recais nos abismos, com essa sensação de círculo fechado.

4. Ora bem, disse-te que havia outro caminho para escapar da vitalidade abismal, esse era o da mutação. Se escolhes essa via é porque queres emergir do teu penoso estado, mas sem estar disposto a abandonar alguns dos seus aparentes benefícios. É, pois, um falso caminho, conhecido como o da "mão torcida". Muitos monstros têm saído das profundezas desse sinuoso corredor. Eles têm querido tomar os céus de assalto sem abandonar os infernos e, portanto, têm projectado no mundo médio infinita contradição.

5. Suponho que, ascendendo do reino da morte e pelo teu consciente arrependimento, alcançaste já a morada da tendência. Práticamente, não te podes deter. Duas finas cornijas sustentam a tua morada: a conservação e a frustração. A conservação é falsa e instável. Caminhando por ela iludes-te com a ideia de permanência, mas na realidade desces velozmente. Se tomas o caminho da frustração, a tua subida é penosa, ainda que a única-não-falsa.

6. De fracasso em fracasso, podes chegar ao próximo descanso que se chama "morada do desvio". Cuidado com as duas vias que tens agora pela frente: ou tomas o caminho da resolução, que te leva à geração, ou tomas o do ressentimento, que te faz descer novamente para a regressão. Ali estás posto diante do dilema: ou te decides pelo labirinto da vida consciente (e o fazes com resolução) ou regressas ressentido à tua vida anterior. São numerosos os que, não se tendo conseguido superar, cortam aí as suas possibilidades.

7. Mas tu, que ascendeste com resolução, encontras-te agora na pousada conhecida por "geração". Ali tens três portas: uma chama-se "Queda", outra "Tentativa" e a terceira "Degradação". A Queda leva-te directamente às profundezas e só um acidente externo poderia empurrar-te para ela. É difícil que escolhas essa porta. Enquanto a porta da Degradação te leva indirectamente aos abismos, desandando caminhos numa espécie de espiral turbulenta, em que continuamente reconsideras tudo o que perdeste e tudo o que sacrificaste no altar de um deus ignoto. Este exame de consciência que leva à Degradação é, decerto, um falso exame, no qual subestimas e desproporcionas algumas coisas que comparas. Tu cotejas o esforço da ascensão com aqueles "benefícios" que abandonaste. Porém, se olhas as coisas mais de perto, verás que não abandonaste nada por este motivo, mas sim por outros. A Degradação começa, pois, por falsear os motivos que, ao que parece, foram alheios à ascensão. Eu pergunto agora: O que atraiçoa a mente? Talvez os falsos motivos de um entusiasmo inicial? Talvez a dificuldade da empresa? Talvez a falsa recordação de sacrifícios que não existiram ou que foram impelidos por outros motivos? Eu digo-te e pergunto-te agora: a tua casa ardeu há algum tempo. Por isso, decidiste pela ascensão, ou agora pensas que por teres ascendido aquela se incendiou? Olhaste um pouco, por acaso, para o que aconteceu às outras casas dos arredores...? Não restam dúvidas de que deves escolher a porta média.

8. Sobe pela escalinata da Tentativa e chegarás a uma cúpula instável. Desde aí, desloca-te por um corredor estreito e sinuoso que conhecerás como a "volubilidade", até chegar a um espaço amplo e vazio (como uma plataforma), que tem por nome "espaço-aberto da energia".

9. Nesse espaço, podes espantar-te com a paisagem deserta e imensa, e com o aterrador silêncio dessa noite transfigurada por enormes estrelas imóveis. Ali, exactamente sobre a tua cabeça, verás, cravada no firmamento, a insinuante forma da Lua Negra. Ali, deves esperar a alvorada, paciente e com fé, pois nada de mau pode acontecer se te mantiveres calmo.

10. Poderia suceder em tal situação, que quisesses arranjar uma saída imediata dali. Se isso acontece, poderias encaminhar-te às apalpadelas para qualquer lugar, para não ter de esperar o dia prudentemente. Deves recordar que ali (na escuridão), qualquer movimento é falso e genericamente é chamado de "improvisação". Se, esquecendo-te do que agora menciono, começasses a improvisar movimentos, tem a certeza que serias arrastado num turbilhão, por entre sendas e moradas, até ao fundo mais escuro da dissolução.

11. Que difícil é compreender que os estados internos estão encadeados uns nos outros! Se visses que lógica inflexível tem a consciência, notarias que, na situação descrita, quem improvisa às cegas fatalmente começa a degradar e a degradar-se; surgem depois nele os sentimentos de frustração e vai caindo a seguir no ressentimento e na morte, sobrevindo o esquecimento de tudo o que algum dia chegou a percepcionar.

12. Se, na planura, consegues chegar ao dia, surgirá ante os teus olhos o radiante sol, que te há-de alumiar pela primeira vez a realidade. Então, verás que em tudo o que existe vive um Plano.

13. É difícil que caias dali, salvo se voluntariamente quiseres descer para regiões mais escuras, para levar a luz às trevas.

Não é valioso desenvolver mais estes temas, porque sem experiência enganam, transportando para o campo do imaginário aquilo que é realizável.

Que valha o que se disse até aqui. Se o que se explicou não te fosse útil, que poderias objectar, já que nada tem fundamento e razão para o cepticismo, próximo da imagem de um espelho, do som de um eco, da sombra de uma sombra.

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A realidade interior

1. Repara nas minhas considerações. Nelas não haverás de intuir senão alegóricos fenómenos e paisagens do mundo externo. Mas também nelas há descrições reais do mundo mental.

2. Também não deves crer que os "lugares" por onde passas no teu andar, tenham algum tipo de existência independente. Semelhante confusão fez amiúde obscurecer profundos ensinamentos e assim, até hoje, alguns crêem que céus, infernos, anjos, demónios, monstros, castelos assombrados, cidades remotas e outras coisas mais, têm realidade visível para os "iluminados". O mesmo preconceito (mas com interpretação inversa) apresou cépticos sem sabedoria, que tomaram essas coisas por simples alusões ou alucinações padecidas por mentes febris.

3. Devo repetir, então, que em tudo isto deves compreender que se trata de verdadeiros estados mentais, ainda que simbolizados com objectos sem existência independente.

4. Tem em conta o que se disse e aprende a des-cobrir a verdade por detrás das alegorias que, em ocasiões desviam a mente, mas noutras traduzem realidades impossíveis de captar sem representação.

Quando se falou das cidades dos deuses, aonde quiseram chegar numerosos heróis de diferentes povos; quando se falou de paraísos, onde deuses e homens conviviam em original natureza transfigurada; quando se falou de quedas e dilúvios, disse-se grande verdade interior.

Depois, os redentores trouxeram a Palavra e chegaram a nós em dupla natureza, para restabelecer aquela nostálgica unidade perdida. Também, então, se disse grande verdade interior.

No entanto, quando se disse tudo aquilo, colocando-o fora da mente, errou-se ou mentiu-se.

De modo inverso, o mundo externo confundido com o interno olhar obriga este a percorrer novos caminhos.

Assim, hoje voa em direcção às estrelas o herói desta idade. Voa através de regiões antes ignoradas.

Voa para fora do seu mundo e, sem sabê-lo, vai impelido até ao interno e luminoso centro.


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