Comunicação não-verbal

por

Samuel Eduardo Pires
Universidade de Coimbra
3030 Coimbra, Portugal
spires@student.dei.uc.pt


Resumo – Neste artigo apresentam-se de forma concisa e sintética os cuidados a ter com comunicação não-verbal. Para tal, descrevem-se os pontos essenciais a ter em conta no uso desta forma de linguagem.
A comunicação não-verbal é a forma não discursiva que pode ser transmitida através de três suportes: o corpo, os objectos associados ao corpo e os produtos da habilidade humana.
Investigações científicas têm evidenciado que a importância das palavras, numa interacção entre pessoas é apenas indirecta. Resultados de diversos estudos demonstram que as relações interpessoais são mais influenciadas por canais de comunicação não-verbais do que verbais. Isto indica que a comunicação não-verbal assume um papel muito importante na comunicação humana.
Este artigo pode ser muito útil para todos aqueles que pretendem comunicar bem, utilizando esta importante linguagem, em que por vezes se dá pouca importância.

 

Palavras-chave - Comunicação não verbal, Linguagem Corporal, Comunicação Corporal.

1. Introdução

Qualquer profissional actualmente têm que estar preparado para esta realidade, comunicar de forma positiva com outros pessoas.
A maior parte da comunicação humana é feita com o uso de gestos, postura, posições e distâncias (comunicação não-verbal ou linguagem corporal). Um estudo feito por Albert Mehrabian sobre o impacto da mensagem mostra 55% do impacto da mensagem é contribuído pela comunicação não – verbal, 38% com os tons de voz e apenas 7% pelas palavras.
É nesta realidade que se pretende cativar o profissional para uma nova ferramenta de comunicação - a comunicação não verbal.
A comunicação verbal é feita conscientemente mas o processo da comunicação não verbal é menos transparente. A comunicação não verbal é usada, em parte, de forma inconsciente, embora possamos usá-la também de forma consciente e estratégica, como por exemplo: "Não lhe disse nada mas fiz-lhe sentir claramente que não gostei.".
Uma boa compreensão desta linguagem é importante para interpretar a opinião dos outros com o qual estamos a interagir.

 

2. Comunicação não-verbal

A comunicação não-verbal é usada por todos, apesar de nem todos saberem usa-la da melhor maneira.
A grande maioria, dos pesquisadores do comportamento não verbal concordam com o facto de que o canal verbal é usado, principalmente, para transmitir informação, sendo o canal não verbal reservado para negociar atitudes interpessoais e funciona, em alguns casos, como substituto de mensagens verbais.

De acordo com Corraze (1982), a comunicação não-verbal é um meio, dentre outros, de transmitir informação, o autor refere-se a este tipo de comunicação como “as comunicações não-verbais”. Estas são definidas como os diferentes meios existentes de comunicação entre seres vivos que não utilizam a linguagem escrita, falada ou seus derivados não sonoros (linguagem dos surdos-mudos, por exemplo). É um conceito que evidencia um extenso campo de comunicações, pois este não se restringe apenas à espécie humana. A dança das abelhas, o ruído dos golfinhos, a expressividade das artes: Dança, Música, Teatro, Pintura, Escultura etc, são também consideradas como formas de comunicação não-verbal.

De acordo com Corraze (1982) para o ser humano as comunicações não-verbais processam-se através de três suportes. O primeiro, o corpo, nas suas qualidades físicas, fisiológicas e nos seus movimentos. O segundo, no homem, ou seja, objectos associados ao corpo como os adornos, as roupas, ou mesmo as mutilações, marcas ou cicatrizes de tatuagens, de rituais ou não. Neste suporte ainda podem ser relacionados os produtos da habilidade humana que podem servir à comunicação. Finalmente, o terceiro suporte se refere à dispersão dos indivíduos no espaço, este espaço engloba desde o espaço físico que cerca o corpo até o espaço que a ele se relacione, o espaço territorial.

Argyle (1978), estudioso e pesquisador dos comportamentos não-verbais, ao abordar o sistema não-verbal, não apresenta a categorização de suportes e sim distingue os seguintes canais: expressão facial, olhar, gestos e movimentos posturais, contacto corporal, comportamento espacial, roupas, aspecto físico e outros aspectos da aparência. Estes canais fazem parte de uma categorização denominada “os diferentes sinais corporais”.

Birdwhistell (citado por Davis, 1979) concluiu, através de seus estudos, que a relevância das palavras em uma interacção entre pessoas é apenas indirecta, pois grande parte da comunicação se processa num nível abaixo da consciência. Segundo este autor, apenas 35% do significado social de uma conversa corresponde às palavras pronunciadas, os outros 65% seriam correspondentes aos canais de comunicação não verbal.

Segundo Rector & Trinta (1985), os trabalhos de Mehrabian e, mais recentemente, os de Appebaum e colaboradores mostraram que a percentagem de comunicação não-verbal na transmissão de qualquer mensagem, numa interacção entre indivíduos, é muito elevada. Os estudos de Mehrabian demonstram que 55% do impacto da mensagem é contribuído pela comunicação não – verbal, 38% com os tons de voz e apenas 7% pelas palavras.

Davis (1979), jornalista, ao apresentar em seu livro uma visão sintética sobre a área da comunicação não-verbal, relata a temática das pesquisas sob os seguintes subtítulos: índices de sexo, comportamentos de namoro, o mundo silencioso da cinética, o corpo é a mensagem, o rosto humano, o que dizem os olhos, a dança das mãos, mensagens próximas e distantes, interpretando posturas físicas, o ritmo do corpo, os ritmos do encontro humano, comunicação pelo olfacto, comunicação pelo tacto, entre outros tópicos.
Assim, os canais de comunicação do nível não-verbal podem ser classificados em dois grupos: o primeiro, que se refere ao corpo e ao movimento do ser humano e o segundo, relativo ao produto das acções humanas. O primeiro apresenta diferentes unidades expressivas como a face, o olhar, o odor, a linguagem, os gestos, as acções e a postura. O segundo também apresenta várias unidades de expressão como a moda, os objectos do quotidiano e da arte, até a própria organização dos espaços: físico (pessoal e em grupo) e ambiental (doméstico, urbano e rural).
Esta diversidade na categorização das condutas não-verbais é reflexo da difícil tarefa de conceituar ou classificar um determinado fenómeno. No entanto, a diversidade de posicionamento permite verificar diferentes aspectos de uma mesma temática e possibilita um leque maior de enfoques e reflexões.
Segundo Davis (1979), a espécie humana, antes da evolução da linguagem, comunicava-se através de seus corpos, gestos e grunhidos, que eram os meios de que dispunham para a compreensão mútua, ou seja, a comunicação efectuava-se através de canais não-verbais. A espécie humana, como decorrência do seu processo evolutivo, elaborou e dominou códigos, articulados entre si, que foram e são utilizados tanto para a comunicação oral quanto para a escrita.
Estes dois níveis de comunicação, o verbal e o não-verbal, podem se apresentar e actuar concomitantemente nas interacções entre indivíduos, complementando-se ou contrapondo-se no discurso. Em determinadas situações sócio-culturais poderá ocorrer uma justaposição de um nível sobre o outro como, por exemplo, nas conversas telefónicas onde a fala está mais presente, embora a linguagem não-verbal esteja também presente. Por outro lado, quando se assiste a uma peça de teatro ou a um espectáculo de dança, o corpo e o movimento podem ser a forma mais privilegiada de comunicação.
Assim, a linguagem verbal pode ser usada para ampliar a não-verbal e vice-versa. Estas duas formas de comunicação podem ainda corresponder no seu conteúdo expresso ou ser discordantes, criando cisões entre o que o indivíduo está verbalizando e o que seu corpo e movimento estão expressando (Corraze,1982).

3. Sentido de Território


O sentido de território vem do sentido congénito, de origem animal. É difícil distinguir a vertente intuitiva (congénita) da vertente cultural (adquirida), mas a primeira prevalece sempre. Quando estamos a comunicar com outra pessoa, deixamos, entre nós e essa pessoa, uma certa distância que faz parte da linguagem corporal. Factores culturais também influenciam a distância entre duas pessoas que estão a comunicar. Estas distâncias entre dois ou mais interlocutores dividem-se em 4 categorias: Distância íntima, pessoal, social e pública.


3.1. A Distância Íntima


- distância íntima próxima ( contacto físico ) - é muito frequente entre pessoas em que há uma grande consciência da proximidade. É natural entre crianças e pais, casais, namorados, entre duas mulheres, na nossa sociedade, ou entre dois homens, na cultura árabe.
- distância íntima afastada ( 15 - 50cm ) - é uma distância aceitável para cumprimentos formais (por exemplo, apertos de mão). É considerada uma distância demasiado próxima entre dois homens, na nossa sociedade. A esta distância é conveniente não olhar nos olhos (por exemplo, em elevadores, transportes colectivos). Se por acaso acontecer, deve-se de imediato desviar o olhar.


3.2 A Distância Pessoal


- distância pessoal próxima ( 50 - 80cm ) - distância normal para cumprimentos formais(por exemplo apertos de mão), confortável para reuniões sociais. Se uma pessoa intencionalmente entra nesta distância, é porque pretende comunicar.
- distância pessoal afastada ( 80 - 120cm ) - distância limite da dominação física(acima desta distância perde-se a privacidade), distância normal para uma discussão pessoal, conferindo privacidade à comunicação, não é aconselhável reduzir esta distância caso a relação entre os intervenientes na discussão não seja para o caso. Quando a conversa convida à intimidade, então sim, a distância pode ser reduzida, mas tendo o cuidado de utilizar uma linguagem adequada a esse grau de intimidade.


3.3. Distância Social


- distância social próxima( 1,2 - 2cm ) - adequada a negócios interpessoais. É a distância normal entre cliente e vendedor e patrão e empregado, pois evita familiaridades.
- distância social afastada( 2 - 3 m ) - considerada normal para relações formais. É a esta distância a que podemos colocar-nos de uma pessoa que esteja a trabalhar, sem a obrigarmos a interromper o seu trabalho para comunicar connosco. Caso aconteça a comunicação a esta distância, devemos olhar a outra pessoa, caso contrário ela poderá entender isso como uma desconsideração.


3.4. Distância Pública


- distância pública próxima( 3 - 8m ) - natural em reuniões informais, aulas, reunião de empregados.
- distância pública afastada( >8 m ) - adequada para aulas e grandes reuniões. É a distância de excelência para os políticos e para os actores, pois os gestos podem ser mais estilizados e mais simbólicos. Aqui recorre-se a meios de linguagem verbal e não verbal.


3.5. A televisão – um caso especial.


Em televisão pode convir uma grande neutralidade da linguagem não verbal, pois muitas vezes não se sabe qual é o plano em que se está a ser captado. Por exemplo, um comportamento intimista está a ser captado num plano geral e um comportamento distante a ser captado "close-up".


4. Postura


As aparências são muito importantes, principalmente as primeiras impressões. Quando nos encontramos com alguém, pela primeira vez, ficamos sempre com uma determinada impressão dessa pessoa logo no primeiro minuto. Existe um ditado que diz: “Você não tem uma segunda chance de causar uma primeira impressão”. Assim é importante que tenhamos uma postura positiva para “facilitar” a comunicação.
postura negativa - olhar indirecto e evasivo, ombros descaídos (demonstra falta de confiança), mexer no pescoço, nas orelhas (indica dúvida), estar com o corpo de lado (significa rejeição).
postura positiva - postura que incentiva a comunicação. Olhar franco e directo, sorriso aberto (atenção amigável), o corpo virado para a frente e postura aberta (revelam confiança).
Mesmo estando sentados sem dizer nada, pode-se estar a transmitir uma mensagem diferente daquela que é suposto transmitir. Quando estamos sentados não é conveniente dobrar as pernas e deixar a coluna descair para trás, pois esta posição transmite a ideia de cansaço e falta de entusiasmo, devendo-se optar por uma postura mais direita e formal.


5. Gestos e modalidades da comunicação não-verbal


Os gestos são uma parte importante da linguagem corporal. Os gestos relatam de uma certa forma o que o indivíduo está a pensar. Toda a gente pode controlar os seus gestos até uma determinada altura. A partir da perda desse controlo, tem que se ter muito cuidado nas palavras escolhidas pois a linguagem corporal pode contradize-las. Quando a linguagem do corpo não está de acordo com a linguagem verbal, temos a percepção da mentira. Os factores culturais também influenciam os gestos, pois de país para país um gesto pode ter dois significados diferentes, por exemplo na Turquia mover a cabeça para os lados significa " eu não compreendo". (Seria o movimento de dizer não no Brasil ou na Europa). Tanto na Turquia como na Grécia levantar um pouco o queixo, movendo suas sobrancelhas para cima e estalando simultaneamente a lingua significa " Não... ". O gesto criado ao unir o indicador e o polegar em um circulo significa `OK` nos USA enquanto na Turquia este gesto significa que alguem é homosexual.

Gesto que na Turquia significa que uma pessoa é homossexual

 

Gesto que na Turquia significa Não.


Uma das partes do corpo mais importantes na comunicação não – verbal são as mãos, pois elementos como a sua posição e velocidade, são uma fonte rica em informação. Vários cientistas observaram que existe mais nervos entre o cérebro e as mãos do que outra qualquer parte do corpo.
Através dos gestos do nosso corpo, podemos caracterizar as várias modalidades da comunicação não – verbal. As modalidades da linguagem corporal são os emblemas, os ilustradores, os reguladores, as expressões de afecto e os adaptadores.


Emblemas - Os emblemas são comportamentos não-verbais que possuem uma tradução direta, podendo ser uma palavra (“Não !”, através do balançar da cabeça) ou uma expressão (“Pintou sujeira !”, ao esfregar a região superior dos dedos na região toráxica). A tradução do emblema é conhecida por praticamente todo o grupo social e o gesto pode substituir ou mesmo complementar as mensagens verbais. As formas mais primitivas do emblema são a pantomina e a mímica. Em geral, os emblemas são utilizados de uma forma intencional e consciente, geralmente nas circunstâncias em que se encontram presentes limitações sensoriais (ruídos, distância ou deficiências sensoriais).

Ilustradores - Os ilustradores podem ser caracterizados como gestos que acompanham a comunicação verbal vocal, ilustrando o conteúdo ou a entonação da mensagem. Geralmente os ilustradores correspondem ao movimento dos braços e das mãos. Segundo uma distinção tradicional, poder-se-ia estabelecer uma distinção entre dois tipos de ilustradores que usam as mãos, os orientados até o objecto, que são movimentos realizados a uma certa distância do corpo, e os orientados até o corpo, que envolvem uma certa manipulação do corpo.


Reguladores - movimentos cuja função é a de permitir um certo controlo da interacção em que ocorre a comunicação verbal. Devemos diferenciar claramente os reguladores dos ilustradores, principalmente porque o primeiro envolve uma conduta informativa, enquanto o segundo tem uma conotação mais comunicativa.
Expressões de afecto - os estudos sobre a expressão não-verbal das emoções, sugerem a existência de dois tipos de expressão facial: as involuntárias (ligadas as emoções básicas), e os movimentos expressivos voluntários (derivados das convenções sociais). Uma das vertentes mais actuais de estudo das expressões faciais emocionais deriva-se no qual se postula a existência de seis expressões faciais universais que corresponderiam a seis emoções inatas: a alegria, a ira, o medo, a tristeza, a surpresa e o asco.


Adaptadores - tratam de expressões que parecem ser vestígios de padrões de comportamento que possuíram uma clara função adaptativa em períodos anteriores da nossa vida, não tendo qualquer intenção comunicativa. Uma pessoa cansada esfrega os olhos da mesma forma que o faria uma criança ao chorar.

6. Conclusões

Pretendeu-se que este trabalho proporcionasse, de forma muito sintética mas objectiva e estruturante, uma familiarização com as várias componentes da comunicação não – verbal e os cuidados a ter no seu uso. Para atingir este objectivo fez-se uma apresentação dos pontos mais relevantes no uso deste tipo de linguagem. Pensa-se que o resultado obtido satisfaz os requisitos de objectividade e a pequena/média dimensão que se pretendia atingir. Pensa-se também que constituirá uma ajuda útil para o leitor que pretenda construir a sua competência no uso desta linguagem. Todavia, a arte de bem utilizar a linguagem corporal, constrói-se com a prática do quotidiano, através da experiência e de muita atenção para a sua compreensão. Como tal, as indicações deste texto devem ser entendidas apenas como um ponto de partida para a boa compreensão e utilização desta linguagem.

Referências


- Acetatos da cadeira de Comunicação Técnica e Profissional, 2002/2003
- RECTOR, M.;TRINTA, A. A comunicação não verbal: a gestualidade brasileira. Petrópolis
Vozes, 1985.
- CORRAZE, J. As comunicações não verbais. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.
- DAVIS, F. A comunicação não verbal. São Paulo, Summus, 1979.
- ARGYLE, M. Bodily communication. London, Metheuen, 1978.
- BIRDWHISTELL, R. El lenguage de la expression corporal. Barcelona, Gustavo Gill, 1970.