Resumo: este é um pequeno guia de regras e conceitos básicos da utilização do correio electrónico habitualmente negligenciados pelos utilizadores e é fruto da observação ao longo dos anos da prática corrente na Usenet e em diversas listas de discussão. É destinado àqueles que nunca as aprenderam ou que já as esqueceram.
Se deseja dar a conhecer este guia, por favor utilize o
seguinte endereço:
http://purl.oclc.org/NET/luis/correio-electronico
Porquê um guia de utilização do correio electrónico? Na escola primária ensina-se a escrever e a endereçar cartas. Ensina-se a começar e a terminar uma carta, ensina-se a colocar o remetente e o destinatário nos locais correctos do envelope, etc... Começa-se, felizmente, a dedicar algum tempo às novas tecnologias nas escolas mas, geralmente, esse tempo é dedicado na sua totalidade às dificuldades técnicas colocadas pelos irritantes computadores. Em que botão é que se carrega? Como é que se escreve a arroba? Porque é que agora deu erro? E por aí fora.
Ainda que existam, indubitavelmente, várias semelhanças entre as cartas de papel e as virtuais e que muitas das regras se apliquem a ambas, a sua forma de utilização é bastante diferente.
Muito dinheiro é investido em tornar o acesso à Internet fácil, acessível ao comum mortal. «Instale a Internet em menos de 1 minuto», ou «É só aderir e começar a navegar!» são alguns dos slogans utilizados pelas empresas. Ora, o comum mortal não aprenderá a utilizar um novo meio meio de comunicação num minuto e certamente um minuto também não será suficiente para aprender as regras de boa utilização. É talvez irrelevante; só é preciso um minuto para começar a pagar.
Este guia é, portanto, destinado às pessoas que têm acesso à Internet mas que nunca pararam para aprender (ou que já esqueceram) as regras de utilização de um dos meios de comunicação mais importantes que esta oferece: o correio electrónico. Naturalmente, muitas destas regras aplicam-se a outros meios, como, por exemplo, as mensagens instantâneas (MSN, Jabber, Skype, GTalk, IRC, ICQ, etc...).
Comecemos pela redacção de uma mensagem. Um erro surpreendentemente comum (especialmente ao escrever mensagens para listas de discussão) é iniciar uma reposta (quando na realidade não o é) e apagar o assunto assim como o corpo da mensagem. Não faça isso. A mensagem irá ser identificada como uma reposta e agrupada com a mensagem original para confusão do destinatário.
Carregue, portanto, no botão «Nova mensagem» ou clique no endereço para o qual deseja enviar uma nova mensagem, etc... Posto isto, há que preencher os seguintes campos:
Este campo parece trivial à primeira vista mas é surpreendente a quantidade de pessoas que não o preenche correctamente. Assim sendo, atente nos seguintes conselhos:
Há muitas Marias na Terra (na Rede?). Coloque pelo menos o seu primeiro e último nome para que o destinatário o possa identificar assim que receber a sua mensagem.
Evite pseudónimos que os seus destinatários possam desconhecer.
Use o endereço para o qual deseja ser contactado em resposta. Repare que este pode eventualmente variar consoante se trate, por exemplo, de um assunto de emprego ou de um assunto pessoal.
Um ou mais destinatários podem ser especificados de três maneiras que podem ser utilizadas em conjunto. Embora a mensagem acabe sempre por ser entregue independentemente dos campos utilizados, há diferenças importantes a nível do significado e não só:
Para: deve colocar aqui um ou mais destinatários principais da mensagem. É a esta(s) pessoa(s) que se dirige o corpo da mensagem.
Cc: este campo serve para que outras pessoas, para além das incluídas no campo «Para:», recebam também a mensagem. Não é a estas pessoas que o corpo da mensagem se dirige, mas são pessoas que por alguma razão devem ser informadas. O destinatário principal saberá que estas pessoas receberam uma cópia. Repare que isto permitirá também que estas pessoas recebam uma cópia da resposta, poupando-lhe assim o trabalho de a reencaminhar mais tarde.
Bcc: é semelhante ao campo «Cc:». A única diferença reside no facto do conteúdo deste campo não ser enviado a nenhum dos destinários, logo permanece secreto. (Uma boa oportunidade para utilizar este campo é quando se envia, por exemplo, uma mensagem informativa para muitos destinatários que não se conhecem e que podem eventualmente não querer o seu endereço divulgado aos outros destinatários.)
Este campo deve descrever concisamente o assunto do corpo da mensagem.
Não se esqueça de preenchê-lo!
Encare este campo como um título de um artigo de jornal. Assuma, por isso, que um mau título pode fazer com que a mensagem seja ignorada ou tomada por lixo.
Seja conciso mas eficaz. Poupará tempo ao destinatário se este começar a ler a mensagem sabendo de antemão sobre o que trata.
Voltando à comparação com um título de jornal, não utilize um título de qualidade comparável ao de um tablóide escabroso com o intuito de chamar atenção. O mais certo é a sua mensagem ser tomada por lixo.
Não confunda o assunto com o corpo da mensagem.
Por último, há que escrever a mensagem propriamente dita. É aqui que o processo se torna bastante mais semelhante ao das cartas tradicionais, mas há também diferenças a ter em consideração. Tenha em atenção os seguinte aspectos:
Se está a enviar uma mensagem a alguém que não o conhece, apresente-se brevemente primeiro.
Seja claro, lembre-se que as pessoas vão dispender tempo a ler a sua mensagem. Faça uso correcto da pontuação, acentos e espaçamento vertical. Tenha atenção à ortografia; os correctores ortográficos ajudam. Em caso de dúvida, dê uso ao dicionário!
Preserve a sua língua. Citando o deputado José Magalhães1: «Se escreve em português, lute contra o estropiamento das palavras decorrente do anglicismo dominante nos sistemas.»
Utilize texto simples. Caso seja necessário, configure o seu programa de correio electrónico de modo a que este envie texto simples em vez de HTML. Respeite os gostos e/ou as necessidades das outras pessoas. O seu estilo de letra ou cor preferida poderão não ser do agrado de outros; o tamanho de letra que escolhe pode não ser de leitura confortável para toda a gente, etc... Utilize texto simples e deixe essa escolha para o destinatário.
Tenha atenção no envio de ficheiros em anexo. Evite enviar grandes ficheiros por correio electrónico; este não é o meio mais adequado para trocar ficheiros. Enviar ficheiros anexados para listas de discussão é particularmente desaconselhado. Procure formas alternativas para disponibilizar ficheiros ou, no mínimo, procure informar-se previamente se o destinatário deseja receber ficheiros em anexo.
Não exagere na pontuação: «!!!!!!», «???????», «!?!?!?!?!!», «.....». Um ponto de interrogação é suficiente para assinalar uma pergunta. Lembre-se também que escrever uma mensagem a alguém não é como um jogo de acção em tempo real, pelo que pode (e deve) parar para pensar sem ter que escrever reticências enquanto o faz.
Mantenha o seu texto com menos de 75 caracteres por linha. Linhas compridas tornam-se mais difíceis de ler. O seu programa de correio electrónico deverá conseguir fazer isto automaticamente. Caso contrário, troque para um melhor.
Assine as suas mensagens, sem exagerar. Utilize uma assinatura com menos de 5 linhas. Esta deve ser precedida por uma linha contendo os seguintes 3 caracteres: «--<espaço>».
Por fim, releia a sua mensagem antes de a enviar.
Naturalmente, os conselhos da secção anterior aplicam-se também a esta. Ao responder a uma mensagem tenha em atenção os seguintes aspectos adicionais.
Tenha em atenção que pode não ser o único destinatário de uma mensagem. Antes de responder, verifique os campos Para: e Cc: para ver a lista completa de destinatários.
Na grande maioria das situações, é esta a opção que quer utilizar. Assim, a resposta é também enviada para os outros destinatários da mensagem original. É geralmente a opção a utilizar quando, por exemplo, está a responder a uma mensagem numa lista de discussão.
Obviamente, se pretende dirigir-se ao autor — e apenas ao autor — utilize esta opção.
É importante que o contexto da resposta seja claro:
Não cite a mensagem original na sua totalidade! Remova citações irrelevantes. Facilite a leitura aos seus destinatários poupando-lhes assim tempo. Mas, atenção, não remova as citações todas; mantenha aquelas que são relevantes e às quais a sua resposta se refere.
Escreva a sua resposta por baixo da citação. Não fazer isto é possivelmente o erro mais comum pelo que talvez seja boa ideia repetir o conselho: escreva a sua resposta por baixo da citação.
Quando a discussão se afasta consideravelmente do assunto original, considere a hipótese de actualizar o campo do assunto com uma nova descrição seguida do assunto anterior entre parêntesis.
Não se esqueça de explicar ao(s) destinatário(s) porque lhe(s) está a reencaminhar uma determinada mensagem.
Pense também se essa pessoa estará de facto interessada na mensagem que tenciona reencaminhar. O facto dessa pessoa lhe ter dado a conhecer o seu endereço não significa que esteja interessada em receber a mais recente anedota que anda a circular na Internet. Perguntar não custa.
Seguem-se alguns trechos do excelente livro de José Magalhães, «Roteiro Prático da Internet»1:
«Sendo uma comunidade diversa, descentralizada e desprovida de órgãos de regulação, fiscalização e tutela coactiva do tráfego mundial, a Internet não dispõe de um Código da Estrada internacional, carregado de multas e coimas, nem de Brigada de Trânsito electrónica. Mas os que nela circulam não se movem no vazio ou numa floresta povoada exclusivamente por máquinas. (...)
Como é natural, não existe, neste como noutros domínios, livro de estilo único, mas antes um mosaico de fontes de regras de conduta. Abundam na Rede os conselhos gerais e particulares sobre as boas maneiras. Por vezes, em certos sítios que visitamos há mesmo quem tenha a gentileza de prevenir que seremos expulsos se não cumprirmos certos rituais, quantas vezes algo bizarros.
Traga para a Internet o seu próprio código de honra, mas aceite algumas prevenções filiadas no mais simples do bom senso:
Não está a lidar com computadores mas com pessoas.
Os computadores (...) são meios para estabelecer comunicação com gente. Gente de carne e osso, capaz de sentimentos e razão irritação, solidariedade, raiva.
Não diga na praça pública ciberespacial — onde pode ser «ouvido» por um número enorme de pessoas (sabe-se lá quantas e quais) — o que não diria cara a cara, em público. O teclado de computador não é o buraco da história do «Príncipe com orelhas de burro» (nem você é como o barbeiro tagarela e tonto). (...)
Evite contar anedotas alentejanas a esquimós
Nunca esqueça que as mensagens têm destinatários. Escrever um recado de duas linhas a um amigo, não é o mesmo que participar num grupo de debate mundial onde as nossas mensagens podem ser lidas por pessoas inseridas em contextos culturais totalmente diferentes. É essencial ter em conta a natureza dos destinatários.
Para os inscritos em grupos de debate e listas de distribuição é imprescindível respeitar os limites decorrentes das finalidades do grupo. As conversas sistematicamente fora do tema são consideradas absolutamente desgostantes e podem ser sancionadas com uma expulsão.
Informe-se cuidadosamente sobre os objectivos e regras de qualquer grupo antes de [subscrever] e não se ponha a ditar sentenças logo que entre na sala — leia o que se anda a dizer, perceba as águas antes de mergulhar de cabeça (como manda o mais elementar bom senso!).
Cuidado com as subtilezas sarcásticas e piadas dúbias.
Excluídas que devem estar, à partida, as bocarras grosseiras e as piadas rascas, sugiro que não alimente a ilusão de que um peculiar humor sarcástico, usado abundantemente, não lhe pode trazer problemas sérios. Não está na TV, não pode fazer gestos, não pode contrariar com o tom da voz a dureza do que escreva. As palavras disparadas do teclado chegam ao alvo, como aquele cowboy mais rápido que a própria sombra. Requintadas cambiantes do seu pensamento ficam pelo caminho. Os destinatários podem responder à letra! (...)
Economia e eficácia.
São terríveis os chatos electrónicos, capazes de chover no molhado, multiplicar lugares-comuns, repetir o que está dito (em melhor) por outros. Fuja a isso o mais possível (sendo certo que no melhor pano cai a nódoa!).
Solidariedade.
Uma das coisas mais espectaculares da Internet é o facto de permitir pedir ajuda a gente detentora de informação sobre coisas que nos interessem ou preocupem. É possível receber da Austrália (ou de Alcabideche), a descrição do expediente mágico que nos desempanca a impressora ou faz aceder a certo [servidor]. Num universo tão grande, há quase sempre alguém disposto a dar uma mãozinha.
Convém, todavia, não abusar, sobretudo quando se trata de informação sobre a qual há na Rede fontes consagradas e ao alcance de todos.
Por outro lado, quando muitos nos ajudam a resolver um problema pode ser adequado reunir as respostas, «aparar» os textos e fazer difusão. É essa capacidade de gerar descentralizadamente informação que caracteriza e torna preciosa a Internet.»
Esta secção foge um pouco ao âmbito deste guia mas, pela sua importância, é incontornável. O correio electrónico não é seguro! Encare uma mensagem de correio electrónico como um postal sem envelope. É mais fácil do que imagina que outras pessoas a possam ler, especialmente se tiverem essa motivação.
É, no entanto, possível trocar mensagens de correio electrónico com alguém recorrendo ao uso de ferramentas como o PGP. Se deseja comunicar com privacidade, informe-se e aprenda a utilizá-lo.
É de salientar que os maus exemplos utilizados neste guia, ainda que tenham sofrido pequenas adaptações, são todos inspirados em casos verídicos. O autor espera que este guia contribua para alterar este panorama. Contribua também.
Críticas e sugestões serão sempre bem vindas.